ADUnB entrevista
Ministro Kassab fala sobre ciência e tecnologia na UnB
Em meio à crise e cortes anunciados na sua área, o ministro da Ciência e Tecnologia Gilberto Kassab, em entrevista na Associação de Docentes da UnB, dia 9/6/2017, em Brasília, defendeu a necessidade de financiamentos em pesquisas no país. "É preciso mostrar para a sociedade brasileira e para o governo que a ciência, tecnologia e inovação são fundamentais para o desenvolvimento social e econômico do país. Eu não conheço nenhum país do mundo que tenha saído da crise econômica sem investir em pesquisa e inovação."
arquivos | 09 junho 2017
O ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Gilberto Kassab, 56 anos, é economista e engenheiro formado pela Universidade de São Paulo (USP). Iniciou na política aos 25 anos participando do Fórum de Jovens Empreendedores da Associação Comercial de São Paulo (FJE-ACSP). Foi vereador, deputado estadual, federal, secretário municipal de Planejamento, vice-prefeito e prefeito da cidade de São Paulo por sete anos (2006 a 2012). Depois, assumiu o ministério das Cidades. Em 2011, fundou o Partido Social Democrático (PSD), que, nas eleições nacionais de 2014.
Como sua experiência como gestor da prefeitura de São Paulo e do Ministério das Cidades ajuda na condução do MCTIC?
A minha experiência como gestor da maior cidade do país por dois mandatos e no Ministério das Cidades permitiu uma visão mais moderna para a gestão. Desde a minha posse, estou ciente das dificuldades que a comunidade científica tem enfrentado em anos recentes e das demandas por mais recursos e melhores condições para a prática de pesquisa e desenvolvimento tecnológico no país. Por isso, demos prioridades para estreitar os laços entre o governo, a comunidade científica e o setor empresarial, por meio de instrumentos como o Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia (CCT) para juntos construirmos uma política com estratégias voltadas para a ciência, a tecnologia e inovação. É importante registrar que conseguimos uma excelente recuperação orçamentária no ano de 2016. O resultado é que terminamos o ano com um orçamento reforçado, com todos os restos a pagar quitados, um fato inédito no Ministério. Em 2017, frente a um momento de recuperação econômica do país, as dificuldades orçamentárias são grandes, e estão sendo enfrentadas junto à comunidade científica.
Quais são os principais focos do Ministério, principalmente na área de Ciência e Tecnologia, até o fim do mandato, em 2018?
Nós retomamos o trabalho do Conselho Nacional de Ciência e Tecnologia para traçar as diretrizes para ciência, tecnologia e inovação e impulsionar o conhecimento e a economia. Estamos trabalhando para aprovar no Senado Federal mudanças na Lei Geral de Telecomunicações, por meio de projeto de lei, adaptando algumas regras ao novo ambiente tecnológico. O objetivo é colocar a banda larga no centro da política pública de telecomunicações, em substituição à universalização da telefonia fixa – atuar para ampliar o acesso da população à internet e melhorar a qualidade das conexões no país. Com a nova lei, as operadoras de telefonia que possuem licença para atuar no setor terão um ambiente mais favorável, que vai estimular as empresas a continuarem investindo na ampliação das redes e na oferta de serviços. Além disso, temos o compromisso em apoiar o desenvolvimento de tecnologias de Internet das Coisas. O MCTIC, em parceria com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), encomendou um estudo que servirá de base para a construção do Plano Nacional de IoT, que deve ser lançado em setembro. O documento vai nortear ações e políticas públicas para o setor até 2022. A Internet das Coisas é a bola da vez, uma grande conquista da tecnologia. As cidades e as pessoas são impactadas pela tecnologia, e estamos trabalhando para criar os instrumentos para que ela possa beneficiar a sociedade. Outro trabalho em destaque no ministério é a migração das rádios AM para FM nos estados brasileiros, para melhoria dos serviços prestados à população, como a qualidade do sinal e o acesso à programação em dispositivos móveis – tablets e smartphones – o que garante a continuidade do serviço e a modernização das emissoras. Já fizemos a migração no Rio Grande do Sul, Minas Gerais e Santa Catarina. A próxima será em Goiás. Até 2018, também faremos a implantação da TV Digital nas principais capitais brasileiras, o que vai melhorar as transmissões das emissoras brasileiras. Já houve o desligamento do sinal analógico de televisão em Brasília e São Paulo. Em números, isso significaria afetar a população de vários países ao mesmo tempo. E não tivemos reclamação em nenhum momento. Vamos ter um avanço significativo na qualidade da comunicação, no serviço de comunicação em qualquer canto, em qualquer lugar. Por fim, o ministério também está participando do projeto Cabo Submarino Brasil-Europa que vai interligar Espanha e Brasil até 2019. Esse projeto, de US$ 212 milhões, é um cabo submarino de fibra óptica para facilitar as comunicações entre os continentes e ligar o Brasil aos principais pontos de tráfego do mundo. Ele está sendo desenvolvido pela Telebrás em parceria com a Eulalink, e sairá de Praia Grande, com uma conexão em Fortaleza, chegando a Sines, em Portugal.
Como o senhor avalia a restrição de 44% do orçamento do Ministério em 2017?
Nós já estamos atuando junto aos Ministérios da Fazenda e do Planejamento pelo descontingenciamento de recursos, que afetam os diferentes órgãos do Governo Federal. Vamos lutar pela recuperação do orçamento total previsto para esse ano. Estamos dando prioridade aos seus 16 institutos de pesquisa e seis organizações sociais, onde foi aplicado um percentual de corte inferior ao aplicado ao ministério como um todo. Também estamos acompanhando criteriosamente as atividades dos institutos de pesquisa de maneira a evitar que impactos significativos venham a ser observados.
Eu não conheço nenhum país do mundo que tenha saído da crise econômica sem investir em pesquisa e inovação.
Quando há necessidade de cortes, áreas como a C&T sempre são afetadas. O que fazer para evitar isso?
É preciso mostrar para a sociedade brasileira e para o governo que a ciência, tecnologia e inovação são fundamentais para o desenvolvimento social e econômico do país. Eu não conheço nenhum país do mundo que tenha saído da crise econômica sem investir em pesquisa e inovação. A questão do financiamento é um aspecto muito importante. Não se faz ciência, pesquisa ou inovação se não tiver financiamento público ou privado, e o poder público precisa promover a articulação para que a iniciativa privada possa atuar. O governo vem buscando isso, por exemplo, com a implementação de parques tecnológicos e o apoio ao empreendedorismo, como o suporte a startups. Também trabalhamos para que o Congresso Nacional aprove um projeto de lei que impeça o contingenciamento de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) a partir de 2020. E vamos encontrar um caminho que possa deixar um plano de investimentos para os próximos anos. Esses contingenciamentos do FNDCT têm atrapalhado muito o desenvolvimento do país.
Além do aumento do orçamento, o que deve ser feito para melhorar a C&T no país?
Os desafios apontados pela Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação sugerem uma abordagem de fortalecimento dos pilares do sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação (SNCTI), que são a pesquisa, a infraestrutura, o financiamento, os recursos humanos e a inovação. A partir do fortalecimento desses pilares poderemos promover a expansão, consolidação e integração do SNCTI.
Como a situação política brasileira atual, marcada por denúncias e delações, afeta o dia a dia das decisões ministeriais?
Nenhuma atividade do ministério foi afetada ou de qualquer maneira influenciada por denúncias ou delações. O MCTIC implementa as diretrizes sugeridas pela Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação e demais projetos referentes a telecomunicações e radiodifusão. Opções de flexibilização e atuação do financiamento da área – como o Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação – são opções viáveis e efetivas? Como o senhor classifica isso e outras ações do Ministério nesse sentido. Sim, sem dúvida. A aprovação do Marco Legal de Ciência e Tecnologia trouxe uma série de aperfeiçoamentos legais para as atividades no Brasil, o que dá aos pesquisadores mais segurança jurídica para seu trabalho. O ministério acaba de encaminhar à Casa Civil a proposta de regulamentação do código, que foi elaborada em parceria com a comunidade científica, universidades e setor produtivo. A expectativa é de que o decreto de regulamentação do Marco Legal seja assinado nos próximos meses.
O corte nas bolsas do CNPq podem ser revertidos até o fim do mandato?
Não houve cortes nas bolsas do CNPq. O MCTIC tem trabalhado para recompor o orçamento e otimizar o uso de seus recursos.
Associação dos Docentes da UnB – 09/06/2017